domingo, 26 de agosto de 2007

ARTE ATUAL-Patrick Van Caeckenbergh




Nascido em 1960 na Bélgica e compatriota de Wim Delvoye (1965), protege a sua liberdade criadora dentro da cerca de um jardim fechado e remete-nos para o imaginário dos livros de fadas e demónios característico da cultura europeia do norte ocidental, particularmente da tradição flamenga. Este artista começou a sua carreira hibernando, literalmente, dentro de uma “Living Box” (1982), espécie de abrigo precário construído a partir de tiras de madeira e cortinas. Viveu dentro deste habitat, simultaneamente sedentário e móvel, entre 1980 e 1984. Este habitáculo que adquiriu o estatuto de obra de arte em 1982 é uma espécie de casa “sobre” as costas como possuem certos animais, como o caracol, a tartaruga as ostras e os mexilhões. O termo que dá título a esta sua primeira retrospectiva em França, “Les bicoques”, pode ser traduzido por conchas ou baiucas.

A Maison Rouge, onde está patente a exposição, foi criada por Antoine de Galbert, e caracteriza-se por uma selecção de mostras bastante personalizada, que concilia retrospectivas de artistas de renome internacional, como Ann Hamilton ( “Phora”, 2005), com artistas do meio parisiense como é Denise Aubertin (“Les livres cuits”, 2006) que estão ausentes da bolsa de valores da arte contemporânea internacional. Existe neste espaço uma programação que privilegia a divulgação de colecções privadas e denota a preferência dada pelo seu fundador à arte bruta e contemporânea na sua expressão primitiva e sexuada.

As quatro exposições deste Verão patentes na Maison Rouge são denominadores comuns desta escolha pessoal: Flavio Favelli concebe uma esplanada para o café da instituição sob a aura dos “Poémes Saturniens” de Paul Verlaine, com mesas e cadeiras lacadas a preto cobertas de borracha preta e com uma iluminação que se faz através de lustres. Felice Varini pinta uma das áreas da Maison Rouge criando uma intervenção cinética que funciona em anamorfose com a perspectiva do espectador, evoluindo com a sua deslocação no espaço. O Pavillon Seroussi foi fruto de um concurso de arquitectura promovido com a finalidade de conceber a casa para o coleccionador privado dos nossos dias, em que participaram 6 agências de arquitectura. E é neste núcleo expositivo dedicado às arquitecturas que se insere Patrick Van Caeckenbergh.

A partir do longo corredor de acesso à principal área expositiva da Fundação avistamos uma cerca de jardim em metal - o portão está aberto e na parede aparecem duas imagens representando o Sagrado Coração de Jesus, com a respectiva coroa de espinhos e a frase incrita “Jardins Clos. Quando se entra no interior do gradeamento vê-se uma série de redomas de vidro, dispostas umas dentro das outras à semelhança das matrioskas russas (“Les oubliettes”). Sinto-me dentro de um cabinet de curiosités, que é afinal uma “Collection de peaux” disposta em dois dos muros da Maison Rouge. São amostras de 5000 variedades de epidermes que, para meu espanto, produzem um misto de prazer, como aquele que sinto ao presenciar o deleite de João César Monteiro ao guardar mais um exemplar na sua colecção de pêlos púbicos femininos (em as “Bodas de Deus”, 1999), a par da amarga lembrança das experiências nazis. Os crâneos de uma série de esqueletos juntam as mãos numa prece desconhecida em “La couronne des dieux suppliants”, os corpos estão cobertos pela saia em veludo de um menino de coro e são os deuses que se ajoelham pelos homens. Esta obra encontra-se ladeada pelas amostras de pele que descobri serem colagens de revistas pornográficas.

Por vezes as criações de Caeckenbergh possuem uma vertente marcadamente primitiva, com influências Dada; apresentam visíveis as marcas de manufactura do seu autor e a inerente sujidade ou imperfeição que resulta da prática de bricolage.

A arte feita à mão. Existe uma dicotomia sempre visível na arte: por um lado, a escolha de certos artistas em encarnar as próprias obras, tocando-as de finitude, libertando ficções individuais. Por outro, os que criam dentro da epopeia tecnológica e digital, num universo em que a perfeição formal é uma exigência. Para estes últimos as ficções de um universo pessoal são apresentadas de uma forma quase totalitária, como um sonho de futuro que todos deveríamos partilhar, como acontece, por exemplo, em “The Creammaster Cycle” de Matthew Barney.

Um paravento (“Le paravent”) em madeira ocupa a área central da sala e esconde uma mesa longa de piquenique que revela, nos pratos deixados vazios, alguns restos da receita “velouté du potager au homard fin” (sopa de legumes com lagostins) de Patrick Van Caeckenbergh. Os copos vazios e as flores permanecerão até à proxima refeição que será partilhada com o artista que convida o seu público a comer e a conviver dentro do espaço expositivo. A próxima será no dia 13 de Setembro, às 19 horas.

Uma porta iluminada de 20 centímetros abre-se por detrás do paravento. É a porta da casa do rato (“Le trou de souris”). Se espreitarmos não vemos o seu habitante mas somos remetidos, uma vez mais, para as histórias dos Irmãos Grimm.

Na parte final do percurso surge uma série de vitrines onde 6 maquetes aludem às diferentes fases do trabalho do artista. Contêm os seus principais projectos, incluindo o da concha-habitat-móvel (“La coquille”): escultura móvel semelhante a uma alcofa para adultos. É mais uma interpretação do Nautilus, a par das pequenas reproduções que se encontravam nos cabinets de curiosités renascentistas. Neste caso com o tamanho necessário para transportar o próprio artista viajante. São variações de casas, de anatomias arquitectónicas e humanas que podemos apreciar nesta mostra pessoal.

O percurso no interior deste mundo-jardim termina com um longo andor suspenso, azul celeste, semelhante aos que encontramos em inúmeras procissões religiosas. O visitante caminha por debaixo deste céu em cetim e tem a ligeira sensação que vai começar a levitar, e talvez passar para um outro mundo.

Patrick Van Caeckenberg revisita a tradição mística das peregrinações e a tradição pictural bíblica flamenga criando com as suas obras uma enciclopédia pessoal. Dentro deste jardim privado promove encontros sensoriais e mesmo gastronómicos (uma das uniões nem sempre assumida na arte), com o seu público.

Existirá nos anos 2000 uma escola flamenga feita de nomes como Jan Fabre (1958), Delvoye ou Caeckenberg, todos nascido na década de 60? Optam muitas vezes, com as diferenças que os separam, por materiais e técnicas tradicionais como o empalhamento de animais presente em “Les messagers de la mort” de Jan Fabre ou o “Rex” de Wim Delvoye. No entanto só Caeckenberg abre as portas dos seu jardim para levar consigo o visitante a jantar. Estamos longe da “white box” da Galerie DanielTemplon. Encontramo-nos na casa vermelha de Paris.


Sílvia Guerra

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

A China e a arte contemporanea-Arte Atual


As primeiras manifestações de modernismo na China aparecem em 1919 com o famoso Movimento de 4 de maio, em que os intelectuais e os artistas pregam uma ruptura com a tradição e buscam abraçar o mundo moderno tirando exemplo do ocidente

Este movimento contribui para a Revolução de 1949 e nessa época os artistas viram-se em direção à pintura a óleo (youhua) como alternativa à pintura tradicional à tinta e pincel (guohua).
Os reformistas propõem tomar como exemplo o realismo ocidental e enviar os artistas para o exterior para que estudem as técnicas artísticas modernas e os sistemas de educação, de maneira a estabelecer academias próprias para difundir os novos métodos.

Em Paris, Lin Fengmian (1900 - 1991) adere ao Fauvismo, Liu Haisu (1896-1994) ao Impressionismo, enquanto Xu Beihong(1895-1952) permanece fiel ao Realismo do século XIX. É ele quem, de volta à China, convence as autoridades a estabelecer em Academias este modelo de pintura do real.É desta época que data a supremacia do Realismo nas Academias chinesas, supremacia que dura até hoje.

Depois da Revolução de 1949 e da proclamação da República Popular da China, um modelo rígido passa a ser aplicado aos artistas. Fundado sobre um texto redigido por Mao Tsé Tung em 1942, a arte é declarada estar ao serviço do povo e ao serviço da revolução.


A partir disso, a arte pela arte é banida e os artistas - considerados exército cultural - desenvolvem um realismo revolucionário utopista colocando o proletariado e o campesinato como heróis.
O enquadramento e a censura são rígidos no interior das Academias e das associações de artistas, e encontram seu apogeu na Revolução Cultural (1966-1976) em que os artistas, assim como os intelectuais, são os alvos.
A morte de Mao Tsé Tung traz de volta, com a política da porta aberta de Deng Xia Ping, uma relativa liberdade de expressão para os artistas. Outros movimentos surgem e testemunham a chegada de uma verdadeira arte contemporânea chinesa.


A relação com o poder chinês continua difícil, os artistas não podem atacar o poder diretamente, mas agem através de ironia, alusões e zombaria. Nessa época, muitas exposições são censuradas e abortadas. Todavia, a situação das autoridades chinesas é hoje em dia mais tolerante e liberal.


Em 1993 ocorre a internacionalização do movimento. É nesse ano que acontece a Bienal de Veneza que apresenta 13 artistas chineses. Nos anos seguintes, vários museus recebem exposições desta vanguarda chinesa.
Em 1999, 25% dos artistas presentes na Bienal de Veneza são chineses. Cai GuoQiang é quem recebe o prêmio da Bienal com sua escultura-instalação "The rent collection courtyard". Esta consagração se torna causa de uma polêmica complexa no meio da arte contemporânea na China. Esta polêmica revela as tensões entre a arte experimental e a arte acadêmica na China, entre intelectuais chineses e críticos ocidentais.


A Bienal de Xangai de 2000, com 2 curadores chineses e 2 curadores internacionais (Hou Hanru e Shimizu Toshio), consagra a abertura da China em matéria de arte contemporânea. A exposição "off bienal" e a famosa "Fuck-off" organizada pelo artista Ai Wei Wei, são bastante radicais e trazem experimentos de artistas a partir de fetos e de restos humanos. Na época, mesmo contra todas as expectativas, estas exposições não foram fechadas pelas autoridades.

Mais info:
http://caffespresso.blogspot.com/2007/05/o-tradicional-encontra-o-moderno-na.html

Alguns Artistas Contemporâneos:



Qiu Zhi Jie
Rong Rong
Feng Mengbo
Wang Qingsong
He An
Wang Guangyi
Chen Wembo

Cartier Foundation-Rock and Roll


«O rock’n’roll é uma música de massa, para o grande público. É um ritmo que se desenvolve depois da Segunda Guerra, quando os Estados Unidos começam a ficar ricos e aparece a indústria do disco. É ligado aos grandes ídolos e principalmente, do ponto de vista musical, a uma simplificação harmônica.»
Fabiano Ribeiro.




A Fundação Cartier em Paris apresenta exposiçao inédita sobre o universo que influenciou o surgimento do rock'n'roll nos Estados Unidos. Situada entre 1939 e 1959, a mostra exibe uma série de cartazes, fotos antigas, objetos típicos, além de muita música. Na década de 50, graças à televisão, o rock'n’roll invadia os lares norte-americanos, provocando uma verdadeira revolução musical e social. A maneira de cantar e de interpretar de artistas como Elvis Presley, Chuk Berry, Little Richard e Jerry Lee Lewis fascinaram as gerações mais novas e chocaram parte da sociedade norte-americana, ainda ligada aos valores conformistas, segregacionistas e puritanos dos Estados Unidos do pós-guerra.

No primeiro andar da Fundação Cartier estão exibidos juke boxes, máquinas de tocar música dos anos 40 e 50, fotos inéditas de Elvis Presley, uma reprodução de um estúdio de gravação, e um um cadillac orginal da época, um dos carros preferidos das estrelas do rock'n’roll. No subsolo, uma série de cartazes, fotos e extratos musiciais lembram os ritmos que influenciaram os precursores do rockn'roll. A mostra Rock'n Roll 1939-1959 pode ser visitada até o próximo dia 28 de outubro na Fundação Cartier, em Paris.

Arte Atual-Mattew Barney


O artista americano fala nesta entrevista sobre seu último trabalho "Drawing Restraint 9", em que ele também é ator junto com a sua mulher, a cantora Bjôrk, que assina a trilha do filme. Barney um expoente da arte contemporânea, conhecido por seus trabalhos intricados, esteticamente impactante, de referências múltiplas e híbridas, vide sua série Cremaster, fala nesta entrevista como seus filmes estão ficando mais cinemáticos, mais narrativos. Mas não muito, que fique claro.



Incensado pelo New York Times como “o artista americano mais importante de sua geração,” Matthew Barney criou uma recente série de filmes de arte que oferece algumas das imagens mais impressionantes vistas no cinema hoje, frequentemente com ele próprio no papel principal. O recente ciclo de filmes “Cremaster” e agora “Drawing Restraint 9,” são filmes que existem como parte de um trabalho artístico maior e que abrangem a escultura, a performance e o vídeo. Em seu novo filme, uma colaboração com Bjork, Barney e sua parceira interpretam os papéis de dois convidados que visitam Nisshin Maru, uma massiva embarcação baleeira japonesa. A bordo do navio, enquanto um grupo trabalha no deck para criar uma escultura feita de geléia de petróleo, os visitantes participam de uma série de elaborados rituais, culminando em uma intensa cerimônia de casamento. As seqüências - dirigidas com uma narrativa clara mas com poucos diálogos - são embaladas por uma poderosa trilha sonora original composta pela artista mais popular da música islandesa.

O filme, abstrato e visualmente magnífico viajou por um número limitado de festivais de cinema e será parte de uma exibição maior dos “Drawing Restraint” na Coréia, Europa e São Francisco.

Como os filmes do artista Matthew Barney são financiados por investidores individuais que possuem cópias do trabalho, seu novo e impressionante trabalho “Drawing Restraint 9” será visto somente por um limitado público nos cinemas e provavelmente nunca será lançado em DVD. Estreiando no IFC Center em Nova York, ele será exibido em menos de 20 cidades nos Estados Unidos. indieWIRE participou de uma prolongada discussão sobre o filme no Festival Internacional de Cinema de Toronto (em setembro de 2005) onde “Drawing Restraint 9” teve sua premiere na América do Norte.

iindieWIRE>> Estou um pouco hesitante em discutir sobre o filme porque sinto que seria necessário vê-lo mais uma ou duas vezes, mas… fiquei pensando sobre esta idéia do ritual: o embrulho dos presentes, a raspagem do cabelo, ou a criação desta escultura naquela embarcação. Depois de ter assistido o filme eu me vi pensando sobre todos os rituais que são relevantes na cultura japonesa e pensei se poderíamos começar discutindo se isso foi um fator para você contar esta história?
Matthew Barney>> Eu fui convidado por um museu no Japão para fazer uma exibição lá, e isso foi mais ou menos há cinco anos atrás. Eu me senti num lugar onde pude encontrar coisas com as quais eu poderia criar fortes relações. Mas, por um outro lado, senti também uma certa impossibilidade ao estar num lugar tão diferente daquele com minha própria cultura… então comecei a pensar sobre o relacionamento entre convidados e anfitriões. Eu mesmo era um convidado deste anfitrião, e pensei sobre como na cultura japonesa existem estes relacionamentos tão formais entre convidados e anfitriões. Existe uma coreografia inteira em torno desse relacionamento e de algum modo, me identificando como um convidado, pude começar a imaginar como poderia fazer isso, e como poderia ir lá e me sentir honesto sobre o que eu estava tentando fazer… Isto provavelmente foi o que me conduziu a este tipo de foco na imagem da baleia, ou na tradição da pesca da baleia, que é muito forte. Também tem a ver com esta imagem romântica de estar dentro de uma baleia, que nós todos conhecemos de “Moby Dick”, de “Pinocchio” e de todas estas outras histórias, que poderiam se encaixar nos relacionamentos convidado/anfitrião que já estavam em algum lugar, de alguma maneira, no meu modo de trabalhar. Todas essas coisas juntas deram início a uma estrutura, ou pelo menos uma base, de todo o meu trabalho.

iW >>Como então isso se relaciona com os outros oito aspectos da série “Drawing Restraint”? Esse trabalho não me é muito familiar mas acho que eles tomam formas diferentes - não são cinemáticos, são baseados em desenhos e, eu suponho, performances.
MB>> Sim, e há uma sala onde existe um vídeo multi-canal, que é uma espécie de meio do caminho entre um tipo de performance em tempo real e um trabalho cinemático.

iW>> E todos os nove trabalhos são parte de uma exibição num museu japonês? Se por acaso eu fosse a essa mostra, eu veria todos esses aspectos representados ali?
MB>> Hmmm. Talvez junto com a escultura do “9”, que é bastante significativa… mas eu acho que o “Drawing Restraint 9” está mais engajado com o Japão no sentido das funções naturais do Shintoismo e também como se fosse uma lente onde pudéssemos ver o mundo completamente. Durante uma das minhas primeiras viagens ao Japão, eu visitei um lugar chamado Santuário Ise. Ise é uma cidade, um santuário Shinto - um do mais sagrados deles. Há um grande número de lugares que têm templos dentro da floresta. Cada um destes lugares é retangular e coberto com pedras brancas e seixos pequenos. Numa metade fica um templo e na outra metade há uma caixa pequena. Durante vinte anos esses lugares ficam assim, e no fim dos vinte anos uma cópia do templo é construída onde estava a caixa e a antiga caixa é queimada. Uma outra caixa é colocada do outro lado e em outros vinte anos se faz uma nova troca. Isto tem sido assim desde sempre. E para mim essa imagem era muito poderosa. Me impressionou a maneira como o Shintoismo encara o fato da natureza ser dependente, ter que se deixar remover para poder criar. E comecei a pensar em como o projeto “Drawing Restraint 9” poderia se relacionar com os aspectos básicos do Shintoismo.

iW>> A indieWIRE te entrevistou quando você lançou “Cremaster 3” nos cinemas e nesta entrevista você falava sobre self-portrait. Eu queria saber se está acontecendo uma coisa semelhante agora, quando você descreve um relacionamento que está acontecendo a bordo de um baleeiro – com todas estas ligações entre tradição, história e ritual – e onde sua parceira (Bjork) é alguém com quem você já está envolvido num relacionamento – isso é um reflexo seu? Você está olhando para um relacionamento particular outra vez? Você está se colocando nele outra vez?
MB>> Eu acho que uma das diferenças fundamentais entre o ciclo “Cremaster” e este meu novo trabalho é que “Cremaster” é como se fosse uma pérola que se desenvolve dentro de uma ostra, ou seja, uma situação muito hermética, ele descreve uma coisa muito hermética. “Drawing Restraint 9” é mais como a maneira que o Shintoismo é descrito, às vezes graficamente, e isso tem a ver com uma série de relacionamentos internos. Se você pensar em sobrepor duas entidades – e no espaço que existe entre elas, procurando o todo - então você pensa sobre um tipo de relacionamento que se multiplica em muitos, muitos relacionamentos e se transforma numa maneira de olhar o mundo como uma série de relacionamentos internos… é como o Shintoísmo, que acredita que o interior da rocha é tudo. Deus vive na rocha, Deus vive na árvore, e em todas as partes vive o todo. Então tudo isso é muito diferente do modelo “Cremaster”. Mas penso que em termos da noção de um relacionamento, eu acho que é um relacionamento nesse nível, em um nível mais exato. Eu pensei que, trabalhando com Bjork, seria mais fácil contar uma história de amor, que era uma coisa que eu queria fazer também. Eu queria que o trabalho funcionasse como uma história de amor, mas acredito que nosso interesse em trabalhar juntos desse jeito provavelmente tinha mais a ver com o lado subjetivo e como nós dois nos relacionamos realmente com a natureza.

iW>> Antes de ver o filme eu não tinha escutado nenhuma das músicas, mas soube que elas foram lançadas antes mesmo que o filme começasse a participar dos festivais. Eu queria saber se você poderia explicar o processo criativo com Bjork, e se isso é uma extensão do “Drawing Restraint 9”, como foi essa colaboração. Como a música dela serviu de informação para a criação do seu filme ou vice-versa? Foi inteiramente colaborativo, ou vocês trabalharam separadamente ? Como foi essa dinâmica de trabalho entre vocês dois?
MB>> Eu acho que existiu um grande número de dinâmicas diferentes dentro deste trabalho. Em certas cenas a narrativa e a música foram desenvolvidas simultaneamente, em algumas cenas ela recebeu o corte para fazer a trilha e outras onde ela escreveu uma parte antes e a cena foi editada depois. Eu acho todas essas dinâmicas interessantes, mas o que mais me interessa é quando as duas coisas são desenvolvidas ao mesmo tempo, e que certamente fica mais natural para este tipo de trabalho porque não há nenhum diálogo. Você meio que depende da música, especialmente quando há letras na música.

iW>> Então de onde veio a idéia da música de abertura - que é basicamente em forma de uma carta - ou como você desenvolveu a idéia de uma carta que se ajusta para contar esta história?
MB>>Eu encontrei uma compilação de cartas do povo japonês para o general MacArthur durante a ocupação, e descobri um tom que senti ser muito apropriado, uma vez que visualmente nós víamos um presente sendo embrulhado. Ler cartas do povo japonês ao general MacArthur, apenas alguns anos depois que a bomba foi lançada, foi completamente desconcertante para mim… ler estas cartas tocantes escritas para ele, eu realmente não podia entender. Havia uma coisa que li num dos livros japoneses sobre os baleeiros, que tinha a ver com uma das coisas que MacArthur fez no Japão, que foi sugerir que eles transformassem embarcações militares em navios baleeiros. A carta do início do filme foi manipulada, eu adicionei algumas coisas sobre baleeiros nela.

iW>> Eu li o texto da carta no encarte do CD e pensei se essa carta foi usada como uma base que você usou para começar a contar a história, conectando com as imagens do embrulho do presente (na cena da abertura). É uma seqüência bonita que vem antes da seqüência formal dos créditos onde as imagens dos instrumentos combinadas dão forma às palavras “Drawing Restraint 9”. É uma prévia surpreendente de onde a história vai. Como isso apareceu?
MB>> É um relacionamento entre um tipo de condição pré-histórica e uma condição contemporânea. Como o fóssil pré-histórico, que é a fonte do petróleo, e a maneira que o petróleo substitui eventualmente o óleo de baleia como fonte primária de energia, e como ambos podem conviver simultaneamente. Aquele tipo de embrulho é usado em ocasiões festivas, como ano novo, ou um casamento. É um típico embrulho de um presente de casamento. E os trajes que se usam na cerimônia chave são para um casamento Shinto.

iW>> Mudando um pouco de assunto: o projeto “Drawing Restraint 9” atinge um ponto culminante, onde você decide trabalhar de forma mais cinemática outra vez. Mas, muitas pessoas, que não terão a experiência de ver todo o projeto junto, vão sentar no cinema durante duas horas e meia e ver o filme. Você poderia explicar um pouco sobre como ou quando você decidiu usar a forma - se é que posso usar essa palavra – cinemática mais tradicional para contar uma história? Você acha que a experiência de um espectador do Japão, que pôde ver o projeto como um todo ou alguém que foi ao Guggenheim e viu tudo do “Cremaster” é muito diferente de um espectador que viu somente o filme num festival?
MB>> Acho que isso começou com o “Cremaster 4”, quando o Film Fórum de Nova York perguntou se poderiam exibi-lo. Acho que eles tinham visto uma projeção que tínhamos feito onde nós mesmos montamos um projetor e exibimos num espaço. Mas sempre quis mostrá-lo numa forma linear. As partes do filme que eu fiz antes eram mais para funcionar como loops em salas com várias telas com projeção simultânea. Com o “Cremaster 4,” eu quis que o trabalho fosse visto do começo até o fim - quando nós fomos convidados para mostrar o filme no Fórum de Nova York, me pareceu uma ótima oportunidade para isso. Mas o mais interessante - talvez não tanto com os “4,” mas com a parte seguinte - “1” e então “5,” um outro público começou a vir para vê-los. Fiquei muito excitado com isso. E acho que isso afetou o modo de como os números “2” e “3” foram feitos…

iIW>> É mesmo?
MB>> Sim, nesses eu pensei como um texto, ou como um filme, e em como eles funcionariam como um filme – mesmo de forma um pouco excêntrica - mas acho que podem funcionar, existe um público para eles. Mas, eles podem funcionar também dentro de um outro sistema, como numa escultura narrativa, em que primeiramente você faz um texto e depois você faz os objetos. Eu começo com uma história e depois faço a escultura dessa história, e as histórias ficam mais e mais elaboradas. Mas acho que isso se deve ao fato de que eu estou excitado por que isso funciona das duas maneiras e assim acho que eu fiz força para ser mais cinemático, porque o trabalho parece ter sido destinado para ser assim e eu tive uma habilidade para fazer isso. Enfim, é muito orgânica a forma que isso acontece, e é também verdadeiro que eu uso o vídeo em primeiro lugar. Quando eu comecei a usar o vídeo, era só uma câmera de vídeo na mão, emprestada de um amigo, que me gravava fazendo alguma coisa em meu estúdio. Era só um registro vagaroso e aos poucos essa ações tomaram um outro sentido, mais direcionado ao personagem, mais narrativo, e comecei a editá-lo, e aos poucos tudo se tornou mais fílmico... Mas lentamente…

Arte Atual- Joseph Beuys


"Todo mundo é um artista."
"Libertar as pessoas é o objetivo da arte, portanto a arte para mim é a ciência da liberdade."
"Tornai os segredos produtivos."
J.B.



Beuys nasceu em Krefeld e cresceu em duas pequenas localidades da região, Kleve e Rindern. Ele travou algum contato com a arte na juventude, tendo visitado o ateliê de Achilles Moorgat em várias ocasiões, mas decidiu seguir carreira em medicina. Entretanto, com a explosão da Segunda Guerra Mundial, ele se alistou na Força Aérea Alemã (Luftwaffe).

Costuma-se dizer que a predominância de feltro e graxa na obra de Beuys é devida a um incidente ocorrido na guerra. Beuys foi alvejado e seu avião caiu durante uma missão na Criméia e ele acabou sendo resgatado por tártaros. Ele teria sido salvo ao ter sido recoberto por feltro e gordura. Não se sabe se essa história é verdadeira, mas agora ela já faz parte do mito que cerca a figura de Beuys.

Depois da guerra, Beuys concentrou-se na arte e estudou na escola de arte de Düsseldorf de 1946 a 1951. Nos anos 1950, ele se dedicou principalmente ao desenho. Em 1961, ele se tornou professor de escultura na academia, mas acabou sendo demitido de seu posto em 1972, depois que insistiu em que suas aulas deveriam ser abertas a qualquer interessado. Seus alunos protestaram, e ele pôde manter seu ateliê na escola, mas não recuperou as aulas.

Em 1962, Beuys conheceu o movimento Fluxus, e as performances e trabalhos multidisciplinares do grupo - que reuniam artes visuais, música e literatura - inspiraram-no a seguir uma direção nova também voltada para a performance. Beuys se associou ao Fluxus e se tornou seu membro mais significativo e famoso. Sua obra tornou-se cada vez mais motivada pela crença de que a arte deve desempenhar um papel ativo na sociedade.

Em 1979, uma grande retrospectiva da obra de Beuys foi exibida no Museu Guggenhein de Nova York, consolidando sua reputação como um dos mais importantes artistas de seu tempo. Ele morreu em 1986 em Düsseldorf.

Beuys foi um dos pioneiros do movimento ambientalista alemão e teve participação ativa na política. Ele fundou várias organizações políticas, como o Partido Alemão dos Estudantes, em 1967 (alemão: Deutsche Studentenpartei DSP), e a Organização para a Democracia Direta, em 1970. Em 1979, ele se tornou um dos membros fundadores do Partido Verde Alemão. Mesmo tendo até arriscado uma candidatura em uma eleição pelos verdes, Beuys expressou no fim da vida desgosto pela política partidária e havia se afastado das atividades do PV.


Trabalhos mais comentados-conhecidos.

A Matilha (1969) - instalação com uma Kombi Volkswagen e 24 trenós de madeira
contendo feltro, lânternas e gordura;
Como Explicar Desenhos a uma Lebre Morta (1965) - o artista vaga pela galeria com o rosto recoberto de mel e ouro, carregando no colo uma lebre morta com quem ele fala;
Terno de Feltro (1970) - um terno de feltro em um cabide de arame;
Canto Gorduroso (1973) - gordura de porco no canto de um espaço. A gordura derrete e se torna rançosa com o tempo;
Eu Amo a América e a América me Ama (EUA, 1974) - performance em que o artista ficou envolvido em feltro em uma sala com um coiote durante cinco dias;
Bomba de Mel no Local de Trabalho (Documenta de Kassel, 1977) - instalação / performance em que alunos da Universidade Livre Internacional de Criatividade e Pequisa Interdisciplinar tomam parte;
7.000 Carvalhos (1979) - Sete mil pedras foram espalhadas em Kassel durante uma documenta: para cada pedra retirada, Beuys determinou que seria plantado em seu lugar um carvalho, na esperança de que a idéia se espalharia para mais cidades.

Sobre a relação Beuys – Barney



MATTHEW BARNEY E JOSEPH BEUYS
All in The Present Must Be Transformed: Matthew Barney and Joseph Beuys


PEGGY GUGGENHEIM COLLECTION
704 Dorsoduro
I-30123 VENEZA

06 JUN - 02 SET 2007


Sobre a relação Beuys – Barney

A relação entre Matthew Barney e Joseph Beuys é tão estreita que impressiona quem nunca pensou nela. A exposição é interessante por fazer esse curto-circuito entre duas órbitas paralelas. Além disso é parca e, para dar conta do paralelismo, usa as peças mais semelhantes de ambos os artistas, os seus materiais fetiche, os seus desenhos crípticos, as suas vitrines, as performances, os vídeos, as instalações, os detritos – englobados nas respectivas e distintas (mas estruturalmente semelhantes) filosofias de vida e arte.

Ambos são exactamente o que fazem, personagens de sua própria criação e construção. Vivem ambos uma história mítica e misteriosa e personificam a figura do xamã ou do anti-herói. Beuys toca mais na realidade social; Barney funciona mais no ciber-espaço cinematográfico. Beuys desceu à Terra e Barney aos confins da Terra.

Beuys cria um mito de origem – a história de que foi salvo na Crimeia, após a queda do seu avião militar alemão durante a Segunda Guerra Mundial, por uma tribo de tártaros nómadas, que o envolvem em feltro e banha de animal; Barney produz um mito de criador onde o cinema e os seus cenários veiculam um mundo de personagens assexuadas e híbridas, que existem numa ficção que une bocados do mundo real – paisagens e elementos soltos – a uma espécie de epopeia cyborg, por entre líquidos e às vezes a alta velocidade.

Vi a exposição durante a inauguração da Bienal de Veneza, o que foi um agradável intervalo na situação hiper-estratificada da Bienal. A exposição sobre a relação que se estabelece entre os dois artistas é clara e estruturada. Marca um ponto histórico muito pertinente. Na altura encontrei o curador Delfim Sardo, que me confessou ter proposto esta mesma exposição no início da sua programação como Director do Centro de Exposições do Centro Cultural de Belém, o que acabou por não acontecer – dado que Matthew Barney, à data, ainda não se sentia preparado para a exposição. Esta, a actual, é comissariada por Nancy Spector, comissária-chefe do Museu Solomon R. Guggenheim, e feita em grande parte a partir do espólio do próprio museu.

A exposição “All in The Present Must Be Transformed, ocupa o Palazzo Venier dei Leoni, tradicionalmente dedicado à colecção de Peggy Guggenheim, e investiga os elementos-chave, estéticos e conceptuais da obra dos dois artistas. Do pós-guerra até 1986, Beuys trabalha essencialmente em Düsseldorf, onde é também professor universitário e activista político; Barney é um artista norte-americano contemporâneo dos mais proeminentes. Ambos fizeram uma instalação site-specific para o Museu Solomon R. Guggenheim de Nova Iorque – Beuys em 1979, Barney em 2003 com o “Cremaster Cycle”.

A exposição centra-se em três tipos de elementos fundamentais e comuns ao trabalho de ambos – as vitrines, os desenhos e as esculturas; centra-se também no exercício de encontrar nos dois tipos de pensamento, um modernista e o outro pós-modernista, as semelhanças no uso metafórico de matérias em metamorfose e a relação que ambos têm com a performance, a acção directa e a sua documentação. Beuys utiliza símbolos com um ideal terapêutico, enquanto Barney os usa para criar um universo singular, que esteticamente cria um sistema próprio e representa uma cosmologia de energias em potencial.

São as esculturas, na sua complexidade, que criam o corpo central das duas mitologias, a par das acções, dos vídeos e dos desenhos que as estruturam. A escultura de Matthew Barney essencial à exposição é “Chrysler Imperial”, que lembra uma máquina destruída da qual se tirou um molde em vaselina. Beuys, com “Honigpumpe am Arbeitsplatz” (Bomba de Mel no Local de Trabalho) (1977), mostra o resíduo da peça que serviu de sistema simbólico às actividades durante a Documenta VI – a peça é agora o que sobrou da instalação que bombeou duas toneladas de mel por tubos que ligaram áreas como a escada à sala de conferências, no intuito de fazer circular calor, energia e criatividade durante os cem dias de conferências, filmes, seminários e activismo social relacionados com a sua Free International University.

Um momento chave da exposição é o vídeo “Field Dressing” (1989), onde Barney interage com uma escultura, mostrando a disciplina do seu corpo atlético em perfeita tensão entre impulsos sensuais e uma resistência perversa e transmitindo a ideia de potencialidade comum a ambos os artistas.


Ana Cardoso

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

I Mostra Índice de Vídeoarte – Recife/ PE


Nos dias 26 e 27 de Setembro de 2007 ocorrerá a I Mostra Índice de Vídeoarte. Com o intuito de promover a difusão e a reflexão da produção contemporânea em vídeoarte – visando uma aproximação deste tipo de suporte artístico com o público interessado –, este evento busca contribuir para o debate, formação e referência sobre a produção contemporânea que utiliza o vídeo como linguagem para a realização de pesquisas artísticas.



1. Bases de Participação
1.1 Poderão participar da I Mostra Índice de Vídeoarte qualquer artista ou grupo de artistas interessados, com obras realizadas em qualquer suporte audiovisual, com resultado final em DVD.



1.2 Os vídeos podem ser enviados até o dia 21 de setembro de 2007.



1.3 Poderá participar qualquer trabalho que utilize o audiovisual como mídia: registro de performance, vídeoperformance, vídeo arte, cinema de artista...



1.4 Cada artista ou grupo terá direito a até 15 minutos de exibição, cabendo a estes decidir quantos vídeos serão exibidos nesse tempo.



1.5 Todos os trabalhos inscritos serão apresentados.



1.6 Para inscrever-se é necessário o seguinte material:

a) DVD com o trabalho

b) Ficha de inscrição preenchida

c) Curriculum resumido


2. Observações Importantes:

2.1 A Produção não se responsabiliza pelo extravio do material ou danos ocorridos ao mesmo durante a remessa




2.2 As despesas do envio e do recebimento do vídeo ficam a cargo do artista ou grupo, que caso queira receber seu vídeo de volta, deve enviar um envelope selado no valor correspondente ao de envio.


2.3 O material deve ser enviado para:
I Mostra Índice de Vídeoarte – Recife/ PE
A/C Museu Murillo la Greca Rua Leonardo Bezerra Cavalcanti, 366
Parnamirim, Recife - PE
CEP: 52060-030


Para maiores informações: (81) 9261 2022 (Barbara Rodrigues)
E-mail: mostrarecife@gmail.com
Produtora da I Mostra Índice de Vídeoarte – Recife/ PE
Barbara Rodrigues (Artista visual - PE)