segunda-feira, 26 de maio de 2008

Artista alemão Gregor Schneider quer transformar morte humana numa performance: "a beleza da morte"

(link)
http://www.artfacts.net/artworkpics/3470b.jpg




O artista afirma que Roswitha Franziska Vandieken, gestora da uma clínica privada em Düsseldorf, vai ajudá-lo a encontrar pessoas dispostas a morrer em público em nome da arte. “Estou confiante que encontraremos pessoas que queiram participar”, disse Scheneider.

O artista disse ainda que gostaria de apresentar a sua "performance" no museu Haus Lange, em Krefeld, na Alemanha. Os responsáveis do museu não querem fazer qualquer declaração sobre o assunto.

Scheneider diz ter ficado fascinado com a ideia de poder representar a morte depois de, em 2000, ter simulado a sua morte numa "performance" no museu Haus Esters. Se o museu não aceitar a proposta, Schneider sublinhou que concretizará o projecto no seu estúdio, em Rheydt, também na Alemanha.

O artista, conhecido pelas instalações pouco habituais, tem neste momento uma exposição na galeria La Maison Rogue, em Paris, que consiste numa série de quartos de tamanho decrescente. Os visitantes têm de entrar sozinhos e, depois de passarem pelos vários espaços, acabam num quarto totalmente escuro. O objectivo é encontrarem uma forma de sair e serem filmados nesse momento.

F: Angola Xyami,com

domingo, 18 de maio de 2008

Duchamp, Man Ray, Picabia – The Moment Art Changed Forever(o momento que a arte mudou para sempre)

Nu descendant l'escalier 1912.Acervo do The Philadelphia Museum



Man Ray, “Cadeau”(presente), 1921. Ferro e pregos.


Francis Picabia, “Femmes au Bull-Dog”, 1940-1942. Óleo sobre cartão. 105 x 76 cm. Centre Pompidou © ADAGP, Paris and DACS, London 2008



De 21 FEV - 26 MAI 2008.



Dificilmente se poderia encontrar uma expressão mais adequada para caracterizar a exposição “Duchamp, Man Ray, Picabia – The Moment Art Changed Forever”, patente na Tate Modern, que a última frase do crítico de arte britânico Adrian Searle, publicada no Guardian há umas semanas: Rather than presenting us with closure and academic posturings, ‘Duchamp, Man Ray, Picabia’ makes the best of their art look vital again, dangerous and alive. É exactamente esta sensação de extrema vitalidade e de actualidade que esta exposição logra em transmitir através do pensamento que estrutura em torno às obras destes artistas.

Estes são três dos artistas de quem mais se fala, cita e alude em qualquer discurso sobre as práticas contemporâneas. São incontornáveis. É impossível pensar nas primeiras vanguardas sem referir o urinol de Duchamp, falar da fotografia surrealista sem evocar “Le Violon d’Ingres” ou a “Glass Tears” de Man Ray ou do Dadaísmo sem aludir aos ‘desenhos mecânicos’ de Picabia. Contudo, e por mais fundamentais que elas sejam, estas constantes referências acabam por colocar um peso demasiadamente grande em algumas obras, condenando uma importantíssima parte da produção destes artistas ao esquecimento ou, na maioria dos casos, ao seu quase total desconhecimento. Este é precisamente um dos grande méritos desta exposição, o de dar a conhecer e de articular obras que são praticamente desconhecidas e ignoradas pela grande maioria das pessoas. O seu resultado é tão mais surpreendente quanto nos dá a ver e a descobrir uma produção de tal modo profícua e original que acaba por construir um novo significado na percepção destes três artistas.

Dividida em 13 secções, que desenvolvem a clássica sistematização temática que conferiu notoriedade ao início da actividade museográfica da Tate, a exposição elabora um percurso que parte dos primeiros encontros e pesquisas destas três figuras históricas do Modernismo, passando pelas obras que realizam em conjunto (tal como os momentos de ócio passados juntos, como documenta uma excelente e divertida série de fotografias dos artistas a jogar xadrez), para terminar com a reflexão que os três artistas realizaram sobre si mesmos, sobre a sua obra e o seu posicionamento no contexto artístico dos anos 1960. Pelo meio, abordam-se temas como o movimento e as máquinas, que ecoam claramente as pesquisas futuristas; os objectos, a sua componente imaterial, a luz e transparência, num discurso que sublinha o contributo destes artistas para a desmaterialização da arte observada a partir dos anos 1960, com todos os movimentos conceptuais a ela associados; e por fim a performance e o erótico, que estabelecem igualmente uma relação com as actividades relacionadas com o corpo, aprofundadas durante a mesma década de sessenta.

As mais de 300 obras em mostra criam um corpus que explora as afinidades e paralelismos entre as pesquisas de Marcel Duchamp, Francis Picabia e Man Ray, demonstrando as suas múltiplas influências e contaminações, que ultrapassam em muito a criação do Dadaísmo ou os contributos dados ao Surrealismo. Deste modo, é extremamente interessante analisar como os três artistas resolveram preocupações comuns, que eram também os principais desafios de muitos dos artistas da Modernidade, como, por exemplo, as questões associadas à representação espacial, à desconstrução da perspectiva tradicional e ao movimento. Se Picabia associava a imagem em movimento à memória e à experiência, o “Nu Descendo as Escadas Num. 2” (1913), de Duchamp, ultrapassa a noção cubista da múltipla representação de diferentes ângulos para explorar o movimento em si mesmo, através de um elemento clássico da história da arte, o nu feminino.

Emotividade e análise conceptual fundem-se nas obras destes artistas, ainda que abordadas de pontos de vista diversos. A pintura de Man Ray (outra grande descoberta para o grande público, que facilmente ignorava o espólio pictórico do artista norte-americano), “The Rope Dancer Accompanies Herself with her own Shadows” (1916), certamente influenciada pela colagem de Duchamp, “The Bride Stripped Bare by Her Bachelors” (1915-1923), revela semelhantes interesses e preocupações.

Ao mesmo tempo que assinala as linhas de cruzamento de pensamento, interesses e estratégias artísticas, a exposição traça um perfil individual de cada um deles, da sua produção e dos diferentes caminhos que acabaram por seguir, sugerindo novas linhas de abordagem e de modos de conceber as obras individuais de Duchamp, May Ray e Picabia. Pela sua dimensão, pelas estratégias adoptadas na sua concepção, pelo impressionante espólio reunido, que junta as peças mais célebres dos três artistas com obras de colecções privadas e praticamente desconhecidas, e pela actualidade, vivacidade e irreverência redescoberta nas suas produções, “Duchamp, Man Ray, Picabia – The Moment Art Changed Forever” é sem dúvida uma das grandes exposições do ano.



Filipa Ramos

terça-feira, 6 de maio de 2008

Anatomia da Specimen Art-Gabriel Bittar.

Gabriel Bittar


O artista plástico paulista Gabriel Bittar questiona se há ética em usar o corpo do outro como suporte artístico. Para adeptos de Specimen Art manter o corpo e a alma juntos é sinônimo de vida





A arte choca, e segundo muitos artistas, essa é uma de suas funções: gerar questionamento, discussões. Damien Hirst, um dos principais artistas vivos, e o mais bem pago atualmente, diz irônico: "afinal de contas, você quer apenas alegrar as paredes das pessoas". A Specimen Art choca simplesmente porque existem muitos tabus em relação ao nosso corpo e à morte. Somos feitos basicamente de água, de fluidos, e temos muito nojo disso. Urina, sangue, saliva, todos líquidos que produzimos são tidos por estes artistas como possíveis matérias-primas, mas não necessariamente para as "belas artes". O que é belo inclusive? Ou o feio? O que é natural, anormal? Esses artistas estão menos preocupados com os aspectos culturais, e mais com o que é real. "Se olhar para essas imagens faz com que seja mais fácil para nós olhar para o aspecto real dos erros da natureza, então terei aumentado a nossa percepção de que a verdadeira feiúra no mundo vem de nós - e não de fora" diz a fotógrafa Nancy Burson.

Marc Quinn, conhecido pela obra Self onde utilizou o próprio sangue na modelagem da imagem de seu rosto, recentemente gerou polêmica em Londres ao executar uma escultura. A obra de 3,5m de altura apresenta a imagem de uma deficiente física nua e grávida, disposta ao lado de outras estátuas de personalidades importantes da cidade. Segundo o artista, "a escultura grega clássica foi mutilada de alguma maneira". Observa ainda que as pessoas não se sentem desconfortáveis quando vêem uma estátua da antiguidade grega, mas sim quando vêem um mutilado ou um deficiente físico na rua.

Para a artista Marina Abramovic, manter o corpo e a alma juntos é sinônimo de vida. A performance, que foi uma das primeiras manifestações artísticas a pensar o corpo enquanto suporte, teve seu auge entre os anos 1970 e 1980 e vem sendo reciclada constantemente como explica Abramovic para a Revista E do Sesc. "Nos anos 70, a performance era muito conceitual, muito relacionada ao corpo e à moda. Nos anos 80, ela passou a acontecer principalmente dentro das galerias de arte e, por isso, estava relacionada às vendas que aconteciam dentro desse espaço - que é feito para isso mesmo, vender o que estava exposto ali. Mas não é essa a sua função, por isso ela teve de sair desses espaços e foi para os clubes noturnos, depois para o teatro, para o museu, voltou para a dança. Por isso, gosto de pensar na performance como uma fênix [ave mitológica que se deixava queimar num braseiro para depois renascer das próprias cinzas]. Ela está sempre queimando, morrendo e renascendo - de uma maneira diferente, com formas diferentes. Nos anos 90, ocorriam muitas performances também, mas não eram pensadas para serem realizadas diante de uma platéia; logo, foram rejeitadas pelos museus." Abramovic conhecida pela genialidade, simplicidade, e polêmicas que causou, que inclusive lembram muitos comentários feitos sobre a obra Exposicíon Nº1 do costa-riquenho Habacuc (em que, supostamente, durante uma instalação deixou um cachorro quase morrer de fome). A opinião pública é unânime: porque ele não fez isso com ele mesmo? Provavelmente funcionaria melhor. Abramovic realizou inúmeras performances onde se autoflagelava, ou ainda onde deixava que o público optasse por isso e ele mesmo implicasse danos físicos à artista, e assim o fizeram. Há ainda registro de suicídios em algumas performances mais radicais na década de 80. Que os artistas queiram usar o próprio corpo como forma de expressão é aceitável, mas usar o corpo alheio em um protesto pessoal, sem consentimento do outro, acredito que não, foge do aspecto do protesto e esbarra em questões éticas. A artista, pesquisadora e professora da Universidade de Caxias do Sul (RS) Diana Domingues, especializada em arte contemporânea, disse para o site G1, "em qualquer campo da atividade humana deve haver respeito à ética. A própria arte cobra esse respeito". Disse sobre a instalação de Habacuc.

A morte da arte ou a morte na arte?
O tabu da morte é tido como o principal, o mais forte, mais intenso tabu nos dias atuais. Teve seu surgimento no renascimento, com a descentralização de Deus, colocando o homem no centro do universo e de todas as coisas: o nascimento da noção de indivíduo. "Na Idade Média, as sepulturas ficavam na igreja estando ao mesmo tempo no centro da vida social", analisa o antropólogo Jose Carlos Rodrigues professor da PUC - RJ, autor do livro O Tabu da Morte. "Estamos reconhecendo o espírito da morte? Ou estamos barganhando com a tecnologia em troca de tempo?" Questiona Marc Quinn.

Andres Serrano, fotógrafo nova-iorquino, realizou uma série de fotografias intituladas The Morgue (O Necrotério), onde traz inúmeras fotografias tiradas com o fino filme fotográfico cibachrome de alta definição, fotografias impecáveis, no aspecto técnico excepcionalmente belas. Fotografou com os sentidos a flor-da-pele, entre outras, Pneumonia Due to Drowning III (Pneumonia Devido a afogamento III). A imagem do close de uma pequena mão de criança, solta, como em um momento de sono, repousa levemente sobre um tecido de algodão roxo-claro (muito comum em enxovais), uma pequena ferida no dorso que chama atenção pela simplicidade, como uma marca de nascença ou um carimbo, uma ferida simples, desviando a atenção do verdadeiro motivo da morte. A pele rosada, aparentemente viva, mas devidamente etiquetada no pulso.

Gabriel Bitar é artista plástico e vive em São Paulo


Artigo Publicado no jornal O POVO.